Para Bruna, Cristina e Luísa, as
protagonistas
Dentre todas as dores e medos, a imaginação é responsável
por curar ou, quem sabe, alimentar aquilo que surge dentro de nós. Pois foi num
apartamento pequeno que a história aconteceu, num lugar silencioso o bastante
para um vulto virar monstro e um rangido se transformar em invasão. Lá, uma
filha conversava com a mãe e a outra se entregava ao incessante sabor da
música, em solos de guitarra improvisados.
Ouvia-se falar de um homem pairado ao
lado de fora do apartamento, perto o suficiente para invadir, por estarem no
tão perigoso segundo andar. Era uma silhueta negra, paralisada, como se
analisasse o melhor momento. Quieta, não manifestava som, por saber se entregar
ao disfarce e à observação. A menina, que não era boba, dizia: “Mãe, tem um
homem ali fora” E conversavam, debatiam, enquanto o olhavam pelo canto da
cortina, escondendo-se por entre os tecidos, não querendo revelar que já o
tinham reparado.
Enquanto isso, a outra escutava, mas
continuava parada em seu quarto, não muito interessada no que acontecia lá.
Vixe, deve ser ladainha, invenção, medo, sei lá. Nessa matemática de irmã mais
velha e nova, a caçula acabava tomando a fama de boba e, então, era
desacreditada por aquela que se dizia conhecedora de muito mais. Por isso, a
outra continuava a tocar, a ouvir a música, não deixando de pescar uma ou outra
frase no ar, pois o som insistia em entrar pela fresta da porta ainda aberta.
Lá pelas tantas, surge a frase alta o suficiente para se expandir por todo o
pequeno apartamento e, até, para os vizinhos.
“Meu Deus!”
Duas palavras, uma exclamação e o
som de passos rápidos pelos corredores. A mais nova não entendeu nada, ficou
sem reação. “O que foi?!” Gritou, sem obter resposta imediata. A mais velha,
por pescar conversa aqui e ali, já entendeu tudo. O homem tinha invadido. Pois
fechou a porta, se colocou na frente dela, pronta a impedir a entrada do
criminoso em seu quarto. Preocupava-se com a guitarra tão valiosa. O coração
acelerado. O medo. E a irmã mais nova parada sem entender nada.
“O pão de queijo!”
Veio, enfim, a resposta da mãe,
enquanto o cheiro de queimado confirmava a falha e o atraso. “Mãe, que susto!”
Disseram as duas, enquanto iam para a cozinha, aliviadas. O terror foi tamanho,
que nem reclamaram e acabaram por comê-lo. Riram muito. Entretanto, quando
foram olhar pela fresta da cortina novamente, o vulto desaparecera. Teria
invadido? A irmã mais nova não dormiu e ficou a tomar conta do que poderia
acontecer.
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