24 de junho de 2013

Vontade de Algodão

Teve vontade de algodão. A moça nunca tivera sentimento parecido. Não era desejo do doce, mas de textura. Maciez que penetra a pele, vai conquistando a alma. Os olhos se fecham para guardar o gosto de vento, quando o rosto é envolto por tantos poros. E o prazer vai indo, indo, indo. Até que pensa: Onde estou? Acha que flutua, os pés estão firmes. Não ouve nada, mas quer uma nota fluida, um piano, um violino, uma orquestra para acalentar. Brisa para transportar o corpo, levar ela e o algodão para longe. Dançariam juntos. Ela deitada nele, vendo nuvens e azul. A noite chegaria e, juntos, contariam estrelas. Quantas eram? Perderiam-se na conta, e começariam de novo.
Mas a vontade ficou muda, perdeu-a. Em vez disso, preferiu adormecer enquanto o ônibus andava e perder o ponto. Bem que podia ter uma brisa para transportar... As reticências mostraram, no silêncio, que continuaria a caminhar sobre terra.
Andou. Andar longo, cercado por cochichos, gritos, segredos e buzinas. Movimento do rush. Explosão de gente que ia. Pra onde? Cada uma pra um lugar diferente.
De repente teve vontade de saber. Onde iam, quando iam, o que diziam. Tinha tanta coisa pra entender. Mistério revelado na mais singela expressão. Curiosidade. Coceira que nasce da inquietude. Intensidade do desejo. Impossibilidade da onisciência. Imagens inventadas, histórias descobertas na ficçāo.  Ah! Ela bem que tinha de admitir: O imaginar era bem mais rico, então resolveu escrever.

Suas primeiras palavras eram sobre vontade de algodão. Seriam uma crônica ou conto? Não classificou. O leitor haveria de imaginar também. E não dá uma coceira inquieta?

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