16 de maio de 2013

Freud explica


A novidade deu o que falar depois daquela Reunião Geral. O fato é que os mortos estavam depressivos, como os deuses andavam percebendo. Sem vontade de partir para a outra vida, encontravam-se muito apegados à antiga. Decididos, os todo-poderosos resolveram lançar uma campanha. Cada uma das almas poderia voltar quando bem entendesse à Terra para passar um só dia. Mas atenção: Nada de pratos quebrados ou qualquer outro tipo de intervenção física. A autorização estava no ato de observar apenas. E ai daqueles que desobedecessem a ordem. Com certeza sofreriam, os deus não tardaram a garantir.

            Alberto, o adolescente que estava no purgatório fazia mais ou menos vinte anos, desceu e não demorou a perceber que os seus amigos estavam muito bem. Um deles já tinha uma família, inclusive casara-se com a sua ex-namorada, uma perfeita traição. Outro se tornou o chefe de uma empresa importante, realizando todos os seus sonhos. A mãe enlouqueceu, não aguentou o desgosto da perda do filho. Já o pai, coitado, entregou-se aos jogos e à bebida. Agora vivia no parque da cidade jogando cartas, todo mal vestido.
            E a Neide, a dona apaixonada pelo seu viúvo marido, encontrou-o se consolando com várias raparigas. A cada dia uma aparecia à sua porta. E como estava bem cuidado! Malhava todos os dias, comia bem e isso tudo só para continuar a sua tão importante vida sexual. Nenhuma foto nos porta retratos. As memórias tornaram-se vazias na vida daquele sujeito.
            E por fim veio o Rodrigo, o rapaz que morrera de aids e até hoje não se esquecia do seu grande amor, o Felipe. Chegou à sua casa e não havia ninguém. Uma série de cartas se acumulava embaixo de sua porta. Abriu-as e não demorou a descobrir que o rapaz se mudara para Los Angeles. Conseguira um papel como ator.
           
            O fato é que essas visitas só serviram para deprimir ainda mais às pobres almas perdidas. Os deuses ficaram desesperados. Havia um déficit de vidas na Terra e várias crianças estavam para nascer. Nós precisamos casar esses mortos com os fetos, dizia o mais desesperado, responsável pelo setor administrativo. E o psicólogo, bem, o pobre não tinha tempo para apresentar uma nova teoria. Atendia aos desesperados de segunda a segunda, 24 horas por dia. Corria o risco de também se tornar um depressivo.
            Os deuses então bateram o martelo. “É o fim. Eles não veem razão para viver. Decretamos estado de calamidade.” A população mundial não tardaria a ficar com maioria idosa. O problema europeu se estendia, mas por ausência de almas. Era um absurdo!
            Culparam uns aos outros, enquanto o purgatório enxia e nenhuma daquelas almas se propunha a descer. Não sei como resolver o problema, o psicólogo admitiu. Então chamem o Freud! Mas o gênio foi mais esperto. Conseguiu uma forma de se matar quando já estava morto. As suas novas descobertas psicológicas foram demais e não conseguiu aguentar.

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