3 de maio de 2013

Os grãos de areia


            Antes de tudo, há sempre aquelas perguntas:
Quanto tempo o tempo dura? Será que o amor tem gosto? Os olhos veem a verdade? O áspero cheira a quê? A flor morre de calor ou frio?

Depois, elas começam a ficar mais objetivas:
Será que demoro muito pra andar a pé pelo mundo inteiro? Que horas você vem? Quantos segundos levo para cair do sétimo andar?
A verdade é que eu sempre gostei de questionários. Quando criança, caprichava nos porquês, uma dúvida mais criativa do que a outra. Meus pais achavam engraçadinho, diziam que eu seria inteligente, pois saberia de todas as respostas. Com o tempo, esse meu hábito começou a ficar chato. Vez ou outra virava pra alguém e perguntava qualquer coisa: As letras ocupam espaço?
Passei a guardá-las para mim, a gente aprende a esconder a própria personalidade com o tempo, quando percebe que as pessoas não ligam. Os humanos são mecânicos. Tão bichos quanto todos os animais. Só são orgulhosos demais para perceber. Por que preferimos andar sobre duas patas, quando dá para correr mais rápido com quatro?
Eu gostava de um jogo que passava na TV. Ele era assim: Um ficava inventando pergunta para o outro, incansavelmente, até que um deles não aguentasse e finalmente respondesse, abandonando todas as divagações. As pessoas gostam de afirmar. Mentem, porque não conseguem admitir a ignorância. Eu sou burra demais. Mas ninguém sabe disso, pois eu também sei fingir.
Houve um dia em que fui para o deserto com uns amigos meus, eles disseram que sempre quiseram conhecer um lugar sem água. Achei aquilo meio estúpido. Era só você cavar e cavar, que com certeza acharia. Mas aí fiquei me perguntando por quantos metros a pessoa teria que tentar até encontrar alguma coisa. Ela com certeza morreria enterrada no próprio buraco. Os rapazes me deram uma garrafa de água e disseram que seria legal se nos separássemos, pra ver quanto tempo durávamos.
E aí fiquei sozinha, debaixo de um sol quente, perto de pedras que pareciam propícias a fritar qualquer coisa. A água esquentou e pensei que seria bom poupá-la, ou poderia acabar morrendo por ali. As perguntas que vieram na minha cabeça foram, mais ou menos nessa ordem: Quantos grãos de areia será que têm aqui? A noite no deserto é fria? Será que o céu está sempre tão azul?
Depois, elas começaram a ficar mais objetivas:
Quanto tempo demoro pra chegar a algum lugar com água? Essas imagens ali da frente são verdadeiras, ou miragens? Cadê todo mundo? A sede vai passar? Alguém vai vir me buscar? Eu vou morrer aqui?
Percebi no deserto que as perguntas conseguem nos medir. Quanto mais objetivas, mais desesperados estamos. Acho que os homens têm tendência a ficar mais desesperados a cada tempo que passa. Devem perceber o tamanho e a inutilidade de cada um. Por isso que odeiam tanto as perguntas e preferem responder. Acham que as afirmações os livrará da ignorância absoluta.
Eu continuo sendo muito burra. Alguns preferem me chamar de doida.
Mas será que os loucos veem a verdade e são assim por causa disso?

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