21 de dezembro de 2012

Olhos coloridos

            No princípio, havia cinzas espalhadas pelo chão, pontas e um isqueiro. Os pés passavam por entre aquela negritude, sujando-se daquela fumaça solidificada, sujando-se com o pensamento que permeou todos aqueles tragos, os olhos vermelhos, devaneios que a levavam para bem mais longe do que já estava. E ela, então, sentava-se em uma cadeira, olhava para o horizonte e imaginava um pouco mais. Imaginava a si e aos outros. Criava tanta coisa junta, que atingia ao nada por não conseguir colocar tudo em ordem.
            Ela estava desordenada.
            Ela estava perdida.
          Ela estava... Estava e não era. Só queria. E imaginava, imaginava, imaginava... O quê? Não sabia. Um lugar, objetos, pessoas, bichos, nuvens, mar...
            O mar se transformava logo em amar e ela se afogava nele, molhava-se com água vermelha e azul. Molhava-se com pedacinhos de papel que não eram atingidos por aquelas gotas. Eles queriam mesmo era sobreviver, porque naquelas pequenas partes de celulose, ela escrevera muito.
            Mas não desvendava as palavras. Estavam borrados. E ela queria tanto lê-las...
            Quando a moça ainda era criança, a sua mãe lhe disse que o mundo dos livros era o melhor jeito de viajar. A garota, acreditando, passou a ler tanto, que se esquecia de comer. Viveu assim a infância, mas a inocência se perdeu com a idade. Descobriu que o melhor jeito de se transportar para além era através das drogas. Com uma mistura de verde, branco e pequenas bolinhas, transcendeu a si mesma e aos outros. Foi para longe, para além do limite humano, esqueceu da razão, porque não precisava dela.
            Queimou assim toda a magia, ao se enfeitiçar com uma diferente. Enfeitiçou-se com o branco que ocupava a vista, com a cabeça pesada para não conseguir pensar. Deitou nas cinzas, sujando-se com a cor do mundo.
            E se ela lesse as suas palavras ou de outros, talvez pudesse ver o diferente. Talvez pudesse...
            Mas os papéis estavam borrados.
            Encontrou alguns em branco e tentou escrever. Dizem que é o maior vício. Ela sabia disso e esgotou a tinta ao criar um mundo que era só dela.

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