A sua mãe devia estar errada. A outra casa, não importava
o quão grande fosse, não poderia ser melhor. O menino pegava em seus objetos e
os separava entre “doação” e “mudança”. Olhava para cada um dos brinquedos,
tendo a dificuldade de se desapegar daqueles tantos coloridos. Enquanto isso, o
pai ficava encostado na porta, opinando sobre quais deveriam ser deixados de
lado. O pobre garoto observava confuso a sua infinidade de coisas e não
chorava, porque não entendia bem o que acontecia. Era a primeira vez que tivera
que se despedir. Nessa ocasião, aprendeu que tudo um dia vai. E ele também ia para
um novo lugar.
Sonhou com um avião indo e indo...
para onde? Viu portas, fechaduras e chaves. Viu tanta gente sem rosto, tanta
gente desconhecida, que acordou num susto, quase como se tivesse caído do
inconsciente. Pegou o urso, que ainda não estava dentro de caixas, e olhou para
o quarto vazio. Cadê todo mundo? Não viu. E ele chorou. Porque descobriu a
ausência. E o achar da falta o fez ficar mais descrente e crescido, mas o rapaz
não precisava desse costume. Ele desejava mesmo era ficar com mente de criança,
podendo viajar e não dizer adeus a ninguém. Entendeu o Peter Pan. O menino
queria mesmo era eternizar tudo. Já sentia saudade...
Cadê aquele ontem? Foi embora lá
atrás, caminhou junto com as suas pelúcias e o velho cachorro Mago. Ah... Como
desejava aquelas patas e a língua lambendo o seu rosto, sem parar mais. E aí a
mãe viria para brigar. “Tira esse cachorro daí!” E o rapaz continuaria com o
rosto afundado nos pelos, enquanto beijava, beijava e beijava... Diria então um
“Eu te amo” sincero, porque bicho sabe ensinar o que é amor. E o animal latiria
aquele latido que mais parece risada, porque sentia cócegas e achava tudo muito
divertido. E era.
O pai chegou ao quarto quando
escutou os soluços. Perguntou o que acontecia e o menino só respondeu “Eu quero
de volta, papai.” A frase abstrata tão concreta. O homem só pôde mesmo foi abraçá-lo
muito forte, para assim aliviar parte da dor. Mas o garoto já conhecia o vazio
e já não era o mesmo. O ontem já tinha ido e agora vinha era um outro amanhã.
Tudo muito novo. E a novidade assustava, porque mesmo trazendo novos presentes,
levava outros...
Cadê aquele ontem?
O garoto sonhou com o passado. Viu
flores, borboletas e jardins. Viu foi o colorido. E percebeu, então, que
haveria sempre as lembranças. E que elas viessem nas noites de verão.
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