Não tenho coragem de escrever. Uma vez colocado em
palavras, o pensamento deixará de ser ele para se materializar em uma verdade
pura, dessas que a gente esconde, assim, nas gavetas, porque há a vergonha da
realidade. Ah... E se pudéssemos mentir para nós mesmos? Talvez pregar peças
nessa mente que tanto quer dizer o que tentamos jogar para debaixo de tudo e
nunca revelar. Mas há um momento em que essa verdade implode. E nos pegamos
pensando nela o tempo todo, enquanto sentimos um aperto no peito de quem está
mesmo é doente. E essa epidemia podia parar de ocupar a gente. Podia é nos
deixar em paz. Mas não encontro cura. E vou indo por essa trilha, evitando
dizer em letras o que deveria, vou me esgueirando por entre as frases, porque
escritor tem disso de inventar ficção. Não tem mentira no que digito em dedos
finos. Vou é falando miúdos, evitando as frases longas. Vou é dizendo sem
dizer, porque essa habilidade com a linguagem me vale de algum disfarce. Será?
Vale é nada. O leitor pode desconhecer do que falo, mas o coração sabe muito
bem do que se trata. E nesse conhecimento a gente se sente ainda mais culpado,
porque queria deixar tudo lá nas profundezas, bem em baixo mesmo. Assim não
veríamos mais. Ninguém veria.
Mas se digo já estou vendo. E fico
meio sem atitude, resistindo ao escrever, porque tenho medo de falar demais.
Posso acabar revelando as minhas entrelinhas.
Poupo-me de amarras.
Vou é me desamarrando toda, colocando letra por letra e
formando algo que já nem mais sei o que é. Só espero que não faça muito
sentido. Porque vai ver assim, exprimo ao menos um pouco dessa verdade toda. Eu
não estou entendendo é nada. Mas sinto e vou sentindo essa coisa engraçada que
invade e vai indo, assim, rápido e lento, e ignoro. Estou mesmo é com a
garganta apertada de tanto falar bobagem para não dizer as coisas certas.
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