Num
dia desses, o mosquito achou uma menina bem bonita. Disse a si mesmo que
ignoraria aos seus instintos. Não pararia para pensar no calor que iluminava os
seus olhos e o fisgava para que arrancasse o sangue. Só chegaria perto se fosse
para beijá-la nos lábios. Só chegaria perto se fosse correspondido. Ficou
voando de um lado ao outro. Visitava pratos culinários saborosos, aprovando
logo a cozinheira que escolhera para si. Tentava não soltar seus zumbidos,
porque tinha medo de que soassem como assobios. Preferia esperar o momento
certo.
Já era noite e a campainha tocou. Ficou pensando em quem
seria. Talvez se tratasse de uma amiga... Mas surpreendeu-se quando um homem
entrou trazendo consigo rosas vermelhas. Eram muito cheirosas, o que desagradou
ainda mais ao mosquito, mas o pequeno ficou quieto, firme em seu posto. Pousou
em um móvel desses altos, cansado de voar e com medo de cair por conta de
qualquer susto que pudesse vir a sofrer.
O casal se sentou, tomando vinho e tendo uma bela
refeição, com direito a pernil e a sobremesa. Quando começaram a trocar
indiretas, e uma música passou a auxiliar no processo, o mosquito não se
aguentou. Resolveu, como um macho, mostrar que dominava o território. Passou a
voar por entre os dois pratos, ameaçando pousar, mas logo se desviando das mãos
incomodadas. Ele rapidamente trocava o alvo, pousava na perna nua do homem e o
picava, arrancando coceiras e desatenção. Ria-se por dentro, pensando que
atrapalhava qualquer coisa.
Houve um momento, no entanto, em que o homem inclinou-se
sobre a mesa para beijar a bela moça. A pobre mosca não se aguentou. Quis picar
a bunda, mas não dava. Então resolveu fazer um pouso na testa, interrompendo o
beijo dos dois. “É esse maldito mosquito”, o homem ia dizendo, enquanto tampava
a vermelhidão. A mulher, no entanto, não foi tão compreensiva quanto o
esperado. Alegou que não dava mais certo. Só podia se tratar de um sinal. Eles
não poderiam mais ficar juntos. Aquilo tudo se tratara de um engano.
O homem, então, saiu de casa, levando consigo as rosas
que a mulher recusou. A música instrumental foi substituída por algo mais
depressivo e a moça se pôs a chorar, desiludida com essas coisas todas do amor.
Por que tudo tinha que ser tão complicado? Perguntava-se. E o mosquito, também
insatisfeito, tentava zumbir que estava ao lado dela, e que tudo daria certo.
Ele poderia até levá-la para voar. Não era romântico? Mas a moça não entendia o
idioma do mosquito e continuou a chorar e a chorar.
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