17 de fevereiro de 2011

Ingênuo dançarino

          Ele era apenas um centímetro mais alto do que ela, e essa medida foi chorada pelo menino, que se envergonhava por ser tão baixo. Devido a isso, implorou para que a menina transformasse os 8 milímetros em um centímetro e aquilo se tornou o segredo de ambos. Ela se divertia e por vezes fazia piadas com a sua altura, e ele se emburrecia, fazendo logo um bico e conquistando um beijo merecido. 
          A história não é do casal formado, porém. Estou dando uma pequena introdução nesse conto que merece uma boa música. A narrativa trata-se mesmo é da formação dos namorados, desde os tempos das aulas de dança que eram verdadeiros bailes.
          O salão de dança localizava-se em Copacabana, mais precisamente na Av. Nossa Senhora de Copacabana, próximo da rua Figueiredo de Magalhães. Ele ia frequentemente ao local, distraindo-se com as moças que por lá passavam, treinando a arte de galantear, e ao mesmo tempo não conquistando ninguém. E ela foi lá só para ver, já sabia dançar, porque aprendera quando criança,  mas fingiu não saber nada e chegou lá com uma timidez tão fingida que era difícil para o mais experiente ator tentar interpretar.
          Ela o viu de longe, mas fingiu não ver, e ele a viu um tempo depois, distraído demais para percebê-la anteriormente. Ao contrário dela, não fingiu. Livrou-se de uma moça qualquer com a qual dançava e puxou-a para a pista. Ela fingiu surpresa com o ato, mas já sabia que isso aconteceria devido à sua visão periférica.
          Chegaram até mesmo a ir para o centro da pista, servindo de exemplo para os alunos que se impressionavam com os passos perfeitos do casal. Ele por vezes cochichava cantadas no ouvido da menina, e esta ria, claramente encantada. Ela o seduzia com o seu requebrado e com os cabelos que por vezes eram balançados, dando charme à garota, que naquela hora beirava a ser a mais experiente mulher. Ela sorria para ele, quando este a rodopiava e a encarava da forma como o mais perfeito amante fazia. Moviam-se em sintonia, um seduzindo o outro sendo que ambos já estavam mais do que seduzidos.
          — Você dança há muito tempo?
          O diálogo não era muito produtivo, a atração era movida pela física dos movimentos e pela química dos olhares. Ele, porém, bobo como era, sentia-se meio perdido no meio daquelas matérias difíceis que enfrentava no ensino médio, e sentia certa necessidade em desviar para o português bem falado.
          — Desde criança — ela respondeu.
          As respostas da moça eram curtas, não queria perder a contagem do 1, 2 e 3. A verdade é que ele era bem melhor do que ela na arte de dançar, mas é claro que ela nunca admitiu tal fato e provavelmente nunca admitiria. E ele seria sempre muito bobo para notar a vantagem que possuía no departamento do salão.
          — Então por que não dançou logo no princípio? Ficou que nem boba parada ali no canto do salão.
          Ela respirou uma vez mais, terminou a contagem, e quando estava na parte fácil da dança respondeu:
          — Eu estava analizando os meus pares.
          — Conseguiu o que queria?
          Mais uma respirada, e a espera pela parte fácil da dança. Tal mistério o fez pensar nos mais diversos foras que poderia tomar. Já tomara tantos que até podia listar uma página ou duas dos mais criativos. A demora, porém, devia-se à incapacidade da moça de contar e falar ao mesmo tempo. É claro que tal incapacidade só refletiu a seu favor nas longas pausas das conversas mais importantes da história do casal. Ele sempre respirava fundo, com medo do que estava por vir, e ela apenas terminava a contagem, e falava, sem notar a ansiedade evidente do rapaz:
          — Definitivamente sim. Se não tivesse conseguido teria ido embora.
          Foi nessa frase que ele percebeu que sua arte de galantear havia finalmente dado certo. Por tal raridade no fato, segurou a moça, e estes tornaram-se verdadeiros pombinhos. Estava claro a compatibilidade de ambos na física e na química, mas o garoto era tão bobo internamente falando, que teve que confirmar as poucas suspeitas no português. É a ingenuidade dos amantes dançarinos, ou talvez, apenas dele.

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