20 de outubro de 2009

Scars

Certo, eu devia ter tentado me matar mais vezes. Aquele pensamento já soava um pouco clichê em minha mente, mas o que podia fazer? Eu simplesmente não podia evitar. Era involuntário. A vontade que tinha de me matar passava por minha mente antes que eu pudesse pensar em outras alternativas.
E aparecia justamente naquele tipo de situação.
Demetri e Evelyn olharam para mim na mesma hora que olhei para ambos pelo canto de olho. Não precisava saber ler pensamentos para ter conhecimento do que estavam pensando. A garota novata que acabara de entrar pela porta da sala de aula era descendente de algum deus. Não dava para saber com exatidão de que deus, mas pela aura era possível saber de longe que aquela não era uma humana comum.
E o nosso dever era o de matá-la.
Não. Demetri, Evelyn e eu não somos ligados ao inferno. Para dizer a verdade, nem sei se esse lugar existe. Nós somos na verdade, scars. Humanos nada comuns.
E isso tudo graças àquele tipo de garota que acabara de cruzar nosso caminho. Aos malditos descendentes de deuses. Por que o mundo não podia ser normal? Se fosse, minha vida certamente seria muito mais fácil.
— Jeremy — escutei a voz de Evelyn me chamar de forma urgente.
Virei minha cabeça na mesma hora para encará-la. A expressão que ela exibia era dignoa de pena. Preocupada, como sempre. Dentre nós três, era a única que realmente se preocupava com a nossa missão de vida. Demtri apenas usufruía seus poderes de forma vergonhosa e eu me entregava a um verdadeiro repertório de lamentações.
Eu só não podia evitar. Será que seria pedir muito por uma vida normal? Devido às circunstâncias, começava a acreditar que sim.
— Eu sei — disse de forma inaudível. Mas eu sabia que Evelyn seria capaz de ler meus lábios. Anos e anos de prática, diga-se de passagem. — Descendente, certo. Mas acho que matá-la aqui não vai ser lá uma boa opção.
Evelyn revirou os olhos e voltou a olhar para o professor que falava algo sobre fungos lá na frente. A atenção dela com certeza estava muito longe de qualquer tipo de expressão das aulas de biologia. Estava longe, tramando um jeito de eliminar a possível fonte de mais um scar.
Agora deixe-me explicar o que diabos está acontecendo. Como deixei claro, sou um scar assim como Evelyn e Demetri. Adquirimos esse título em uma maldita brincadeira de criança. Tivemos a brilhante ideia de empurrar uma criança numa piscina. Ela não sabia nadar e morreu.
Mas esse não foi o fim da história.
Em um belo dia descobrimos que podíamos fazer coisas maravilhosas. Ler auras, por exemplo. Praticamente todas as auras têm a mesma essência, menos as auras de humanos descendentes de Deuses e é claro, de scars. Os últimos citados têm uma aura vermelha, quase chegando a um tom preto. Sempre interpretei isso como algo podre, mal. Mas aparentemente Demetri não achava nada disso, acreditava que a ideia de ser um scar era maravilhosa. Criancice. Não tem melhor definição para explicar o que é.
E nós temos que matar os humanos descendentes. Porque se não o fizermos, outras pessoas poderão matar esses descendentes do divino e acabarão se tornando scars como nós.
Não é empolgante?
Não.
Porque scars têm poderes muito impressionantes e se um engraçadinho resolver se aproveitar deles, já era.
Tivemos muitas experiências nada interessantes com esse tipo de scar. Agora procuramos evitar que esse tipo de experiência se repita matando descendentes de deuses.
E essa não é uma rotina invejável, só para constar.

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