Formavam
uma roda sem simetria ou qualquer lei. Atrás, alguns tocavam pandeiros,
tambores e cavaquinhos. A música era improvisada, liberdade exprimida em notas
que logo viravam vibração e dança. Não tardava, e alguns se aventuravam, entravam
e dançavam. O bairro era o de Santa Tereza, o ar histórico e as casas já idosas
dali davam ainda mais poesia ao pequeno evento. Perto, um grupo tomava cerveja,
ria e conversava. Ninguém censurava ninguém. Nem notavam erros. Só viviam. Aquilo
ali era saber viver.
Depois de três músicas, um rapaz
entrou na roda com uma moça. Ele a segurava, jogava para cima e pulava. Ela
parecia dançar ballet. Vestia saia por cima de uma calça legging, estava descalça e usava uma blusa azul apertada. Seus cabelos
eram curtos, e voavam ao vento, não domesticados com o arco vermelho.
Quem olhasse, não saberia se eram
namorados. Imaginariam. Mas não importava muito. O espetáculo estava naquele
todo. Carros passavam lentos, assistindo, quase batendo. Pedestres caminhavam,
paravam e andavam, olhando para trás vez ou outra, ainda curiosos com o que
acontecia.
Não importava quais problemas
existissem. Esqueciam ali, e só. Mais tarde lembrariam. Ou adiariam, quem sabe?
Ainda comovidos com toda aquela energia boa de um grupo que só fazia o bem.
Um menino desses raquíticos, de rua,
chegou para dançar. A mãe que o olhava de longe ficou um pouco envergonhada,
porque não queria interromper a arte. Disse que a desculpasse, porque não tinha
visto o menino indo e que ele era meio impulsivo. O pobre foi censurado pelos
braços da mãe, que o puxaram de volta, aprisionando-o em um abraço sem qualquer
afeto.
O dançarino, vendo aquela situação,
só riu. Afirmou que não fazia mal algum. Pelo contrário. Ajudava a roda. Puxou
o menino, que assustado, entrou no meio do casal sem saber ao certo o que
fazer. A garota pegou nos bracinhos para que ele se soltasse e depois de alguns
poucos segundos não se fazia necessário qualquer intervenção. Ele entrou na
dança.
E aí se esqueceu da fome. Esqueceu
que apanhava do pai à noite. Da escola que não frequentava. Esqueceu foi de
tudo. Sorriu sincero. Riu demais mesmo. Foi feliz. Naquele espetáculo, o
milagre vinha e ficava. Dançou foi muito. Ele ali, no meio do casal, que
ninguém sabia se era de namorados. Nem importava.
No final, o garoto com o jeito inocente que toda
criança tem, perguntou se namoravam. A moça riu, e o rosto do rapaz ficou
vermelho. Não responderam. Nem precisavam.
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