— Vai dar tudo certo, Julia.
— Claro que vai — respondi, mas é óbvio que não notou o sarcasmo. Nunca percebia nada, nem mesmo a sujeira do próprio umbigo.
Tínhamos nos conhecido em meu trabalho. Servi um café expresso, e perguntou o meu nome. Eu apenas disse para ele olhar o meu crachá. Depois disso, voltou todos os dias. Sempre questionava algo pessoal. Você gosta de música? Já conheceu o Nordeste? Qual curso de faculdade faz? De onde veio? De início eu não falava nada, apenas informava que a única coisa que iria responder era sobre o recheio do novo sanduíche. Porém, acabei aceitando pela persistência, e quando percebi, estávamos saindo juntos ao final do mês, em um restaurante chique de comida italiana.
Ele só confessou que era casado depois do primeiro mês de namoro. Prometeu que ia largar a mulher e foi no meio dessas promessas vazias, que acabei engravidando. Fiquei feliz, porque vi ali a chance de construir uma família. Eu iria me graduar ao final do semestre, e poderia trabalhar até mesmo com ele, já que era advogado.
Acho que sempre fui muito fraca e ainda sou, porque aceitei.
— O médico disse que o procedimento é rápido. Você estará acordada em algum tempo.
Observei a enfermeira dando-me a anestesia, e fechei os olhos, preparando-me para dormir. Senti o seu beijo em minha boca, e tive vontade de cuspir na cara dele. Como sempre, não passou da vontade. Meu corpo foi ficando mole aos poucos, e acordei ainda zonza, com Matheus ao meu lado.
— Agora você pode ir embora, se quiser. Não é isso o que deseja? — as palavras saíram da minha boca antes que eu pudesse puxá-las de volta. Ele olhou para mim, assustado, e por um momento não teve o que dizer. Porém, encontrou as frases certas, como o bom advogado que o era.
Não havia mais porque acreditar.
Algo bem no fundo de mim, desejava que eu estivesse errada. Que houvesse uma razão para que tomasse essa atitude. E aí, dentro de uns dois meses, quando tudo se acertasse, estaríamos vivendo juntos. O problema é que não tenho o costume de errar e isso é uma droga. Ele se levantou, deu-me um beijo na minha bochecha, como se tivesse se despedindo de uma amiga qualquer em uma situação normal, e deu as costas. Nessa hora, coloquei a minha mão direita sobre o meu abdome, e senti as lágrimas caindo. Eu nem tivera a chance de saber se era menino ou menina. Mas já tinha comprado um sapatinho vermelho, que pretendia ter exibido na noite da notícia. Ficou na minha bolsa, largado, e tive medo de tirá-lo de lá e acabar caindo em prantos. Mesmo com tal temor, me desmanchei em gotas.
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