10 de novembro de 2011

Cinza no escuro

             Sem horizonte. Não vejo o céu, tudo é feito de concreto. Pessoas passam por mim sem olhar. Alguém cai no chão, cabeças viram apenas para verificar se ainda é seguro. Estáticos. Mente sem movimento. Coração pulsando de maneira robótica, sem sentimento. O relógio bate ao fundo. Percebo o atraso, acelero o passo, desligo-me ainda mais do que está à minha volta. Não vejo nada. Não quero ver. O tempo é precioso naquele local insano. Caso houvesse modo de comprá-lo, o vendedor já estaria rico.
             Pés na poça de chuva. A cidade chora. Tempo típico daquela metrópole. A famosa garoa. Cinza. Preto e branco misturados, formando a cor do medo. Estão todos amedrontados. Mãos seguram as bolsas enquanto os olhos analisam quem está por perto. O inimigo pode estar do seu lado.
              Entro na estação. Primeiro português, depois inglês e finalmente espanhol. Escuto a voz anônima anunciar o próximo trem. Passo o cartão, ando, entro, paro. Não tem lugar para sentar, todos ficam espremidos, sem sorrir. Parece um enterro. Homens de terno e preto, mulheres usando saias escuras com camisas formais. Alguém fala no telefone ao fundo. Outro presta atenção na conversa, tentando conseguir algo para se distrair. Olho para fora. Subterrâneo. Pouca luz.
              O trem para. Todos os corpos se movem ao mesmo tempo, feito uma dança. Saio junto com os outros, movimentando-me em sincronia. Subo as escadas. Vejo o prédio preto e alto. Quinze andares. Atravesso a Paulista. Entro. Pego o elevador. Dou boa tarde para quem está dentro. Rostos conhecidos. Sorrio por educação. Escuto o bip anunciando que tenho que sair. Saio e dou bom dia. Encontro com meu chefe. Sento em meu escritório. O relógio passa lento, o tempo sempre escolhe o lado errado.
Acaba. Levanto-me com os outros. Descemos juntos. Unidos apenas pelo trabalho, mais nada. Pego uma carona com um colega e ele me deixa na porta de casa. Entro e me deito. Olho para o teto. Adormeço sem perceber e sonho com o aleatório. O dia estava para começar.

1 comentários:

Gi Zamai disse...

Uma rotina estafante, pessoas separadas pelo medo e insegurança. É o cotidiano de muitos. Abraços

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