30 de julho de 2012

A estrada


            Não sei se gosto de estradas. Varia muito. Rodovias são bipolares. A gente ama ou odeia. Ponto. Nesse momento, por exemplo, sinto uma raiva profunda. Olho para as linhas amarelas que dividem as duas pistas e tenho vontade de rasgá-las, uma a uma. Mas sei que se eu fizer, o caminho continuará lá, à deriva, e ainda terei que atravessá-lo. Não importando a minha vontade. Dá até para sentir a indiferença do asfalto. A maneira como ele está quente abaixo das rodas do carro. O barulho do motor parece uma música provocante. Vontade de gritar e voltar.
            As estradas guardam histórias. Decepções, amores esquecidos, sorte, felicidade, raiva, inocência... Elas sabem tudo. Veem tudo. E ainda assim conseguem continuar ali, quietas. Alimentando-se da vida de outro. Não fazem nada. Só guiam o caminho que pode nos levar para o que precisarmos. Às vezes não temos escolha.
            Não quero sair de casa. Já enjoei de brincar de adulto. Pode voltar o tempo, por favor. Estou dando meia volta no retorno.
            Dá para imaginar quantas pessoas passam por aqui. Milhares? Varia de acordo com o dia. Está tudo quieto agora. Sou iluminado pela luz do carro e de alguns postes. Vejo motéis vez ou outra na beirada. Devem estar vazios. É segunda.
            Recebi a notícia de uma morte. Tenho que ir para o funeral. Vestir preto. Chorar. Mas não gosto de derramar lágrimas. Elas nos dão a sensação de que o mundo pode acabar. Que não tem volta. Que não há esperança. Sempre gostei muito da esperança. Mas hoje em dia não podemos ter mais o luxo de sentir. Precisa pagar caro pela felicidade.
            Contaram quase sete bilhões de pessoas no planeta. A única que eu precisava foi embora. Depois disso, dá vontade de sair matando outros. Para ver a dor daqueles dependentes das pobres almas assassinadas. Encontrar conforto na desgraça alheia. Mas não sou assassino. Não tenho esse espírito. Tenho medo de insetos.
            Então vou dirigindo. Liguei o rádio e estava fora do ar. Aí fiquei pensando. Mas pensar dói. Queria saber aquelas técnicas de meditação. Deixar a mente em branco. Não consigo. Então dirijo. Daqui a um tempo o caminho acaba. Tudo vai piorar. Porque nada é quieto como uma estrada. Nada é tão reconfortante e ao mesmo tempo apavorante.
            Rodovias são bipolares.

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